Neste primeiro momento estudamos o surgimento da Abordagem Centrada na Pessoa, de Carl Rogers. Este movimento surgiu nos anos 1950, nos Estados Unidos e na Europa, em consequência de uma insatisfação com as direções até então assumidas pela Psicologia, como lembra Pretto (1978), salientando que
“Nesta época surgiram trabalhos que enfatizavam uma centralização na pessoa, nos valores humanos, naquilo que é fenomenológico e existencial. Destina-se finalmente a todos aqueles que estão interessados no estudo científico da criatividade, do amor, dos valores humanos mais altos, da autonomia, do crescimento, da auto-realização” (PRETTO, 1978, p. 11).
As consequências da II Guerra Mundial atingiram profundamente a dimensão subjetiva, gerando conflitos existenciais e a necessidade de buscar soluções para estes problemas. À medida que as pessoas vitimadas pela Guerra sofreram com a perda de seus entes queridos, uns por assassinato, outros ainda por suicídios, destruindo a família e laços de comunidade, os traumas de ordem emocional, causando inúmeros prejuízos, principalmente psicológicos, começaram a se manifestar nestas pessoas.
A dignidade humana foi abalada e muito pela falta de condições favoráveis ao ser pessoa, pois era comum se encontrar feridos, machucados, muitas vezes sem reações diante do caos provocado pela Guerra, fragilizados em todos os sentidos. Com isto, ficou mais patente a necessidade de as pessoas serem consideradas em seus afetos para, ao menos, encontrarem sentido ou direção para suas vidas.
Visando chegar a um novo paradigma de ser humano, no qual o centro das atenções seria a pessoa saudável, que sente a vida, se alegra, se entristece também, mas que tivesse a oportunidade de expressar suas emoções sem medo, receio ou desaprovação alheia, mas que fosse ela mesma, o respeito à
dignidade do homem e o reconhecimento de seu valor teriam de ser resgatados de alguma forma.
Desta visão positiva do ser humano, nasce a abordagem centrada na pessoa do psicólogo norte americano Carl Rogers, que tem como premissa enfatizar os aspectos saudáveis e positivos do homem.
Uma abordagem centrada na pessoa baseia-se na premissa de que o ser humano é basicamente um organismo digno de confiança, capaz de avaliar a situação externa e interna, compreendendo a si mesmo no seu contexto, fazendo escolhas construtivas quanto aos próximos passos na vida e agindo a partir dessas escolhas (ROGERS, 1978, p. 23).
Infere-se por este pensamento de Rogers, que ao se ter o olhar positivo diante da pessoa que se apresenta, é reconhecer neste, a possibilidade de enxergar a potência de vida existente em cada indivíduo, valorizando os recursos individuais em prol de seu autodesenvolvimento e capacidade de criação.
É oportuno ressaltar que a autoconfiança na pessoa, vem da compreensão de que o organismo tem a capacidade de auto direcionamento na escolha do que for adequado para a sua auto realização. Assim sendo, escutar o que ocorre no próprio organismo é fundamental para fazer escolhas e definir os passos a serem seguidos por cada pessoa, pois como ensina Rogers:
A abordagem centrada na pessoa reconhece a pessoa como sujeito de sua própria experiência e, pela colocação da habilidade especializada a serviço da busca de uma existência autêntica, ela radicalmente afirma uma crença em uma tendência atualizante nos seres humanos (ROGERS, 1983, p. 95).
Este tipo de abordagem visa atualizar o que o organismo está pedindo para ser executado, manifestando em atos concretos este apelo de satisfação, manutenção e elevação da potencialidade que o organismo exige, promovendo, assim a autenticidade.
Esta tendência é inerente ao ser humano e visa o crescimento espontâneo e pessoal em cada indivíduo, como se fosse uma espécie de mola propulsora que atinge e impulsiona a realização das expectativas do organismo e é nisto que Rogers enfatiza, ao mencionar a necessidade de reconhecimento de desenvolver potencialidades na vida.
A exposição a uma abordagem centrada na pessoa significa que existe um impulso na direção de experienciar maior confiança mútua, crescimento pessoal e interesses compartilhados. Os
companheiros tendem a desenvolver maior confiança entre si, à medida que são mais reais um com o outro. Sendo mais reais, assumem maiores riscos em serem abertos e, desta forma, acentuam seu crescimento como pessoas. À medida que se comunicam mais profundamente, estão mais aptos a descobrir e a desejar desenvolver mais interesses que possam compartilhar (ROGERS, 1978, p. 56).
À medida que o indivíduo tem uma abertura à experiência, ou seja, vivenciando o que seu organismo sinaliza em termos de afetos para ser executado, com a congruência de manifestar na prática tais sentimentos, novas possibilidades de estabelecer encontros de autoconhecimento. Com isto, ele se sente mais seguro para investir suas forças no conhecimento, como ressalta Klocner:
A psicologia e a ACP que acreditamos, facilita processos de autonomia e potência, produz subjetividade. Sai do um, transcende para as relações e afeta o coletivo. Afeta no sentido que interfere e modifica os afetos das pessoas envolvidas, mudando seus olhares e suas formas de lidar consigo mesmas e com os outros – transformando as relações (KLOCKNER, 2010, p. 155).
Rogers denomina a Abordagem Centrada na Pessoa como ‘um jeito de ser’. Esta aparentemente banal ou superficial, não é apenas uma teoria explicativa, mas implicativa, ou seja, adquire profundidade no encontro de consciência, experiência e comunicação. Segundo o autor, neste encontro acontece o processo de congruência que será explicado adiante.
A principal preocupação de Rogers é que esta abordagem atinja os afetos. O autor valoriza os sentimentos humanos, em favor do crescimento da pessoa como um todo integrado, capaz de decidir-se e ter autonomia nos processos de escolha.
Assim, a teoria de Rogers contribui para pensar uma educação humanista, que é, antes de mais nada, voltada para formar cidadãos congruentes, conscientes de sua autoria na vida e senso realista de seu caráter identitário.
REFERÊNCIAS
KLOCKNER, Francisca Carneiro de Sousa. (Org). Abordagem Centrada na Pessoa: A Psicologia Humanista em Diferentes Contextos. Londrina-PR: Ed. Unifil, 2010.
PRETTO, Siloé Pereira Neves. Educação Humanista: características de professores e seus efeitos sobre alunos. 1ª Ed. São Paulo: Cortez & Moraes, 1978.
ROGERS, Carl R. Sobre o Poder Pessoal. 1ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1978.
ROGERS, Carl R. et al. WOOD, John K. et al O’HARA, Maureen Miller. et al. FONSECA, Afonso Henrique L. da. Em Busca de Vida: da terapia centrada no cliente à abordagem centrada na pessoa. São Paulo: Summus, 1983.