A discussão em torno do processo de aprendizagem do aluno é algo que sempre está em pauta no desenvolvimento da prática pedagógica por parte do professor. Verificar quais as condições do aluno perante as dificuldades e as limitações acerca do nível de desenvolvimento intelectivo e outras demandas correlacionadas a esta problemática fazem parte das inquietações da carreira docente.
Quando se trata de aprendizagem do aluno na educação superior, temos que fazer uma leitura contextualizada, que possibilite um olhar diferenciado diante da história de aprendizagem com que cada aluno vivenciou, desde os primeiros dias na escola até o momento. É evidente, porém, que isto não é papel do professor, mas também deve ser levado em consideração, para a compreensão dos elementos norteadores do processo ensino-aprendizado, extremamente importantes para o desenvolvimento cognitivo do aluno.
Para mim, facilitar a aprendizagem é o objetivo da educação, a maneira pela qual podemos aprender a viver como indivíduos que querem tornar-se pessoas … Sabemos … que a iniciação de tal aprendizagem não se baseia nas habilidades pedagógicas do líder, nem no conhecimento erudito que tem do assunto, nem em seu planejamento curricular, nem na utilização que faz dos recursos audiovisuais, nem no ensino programado que emprega, nem em suas preleções e exposições, nem em uma abundância de livros, embora, em certas ocasiões, cada um destes itens possa ser utilizado como um expediente importante. Não, a facilitação da aprendizagem significativa se baseia na qualidade das atitudes que existem no relacionamento pessoal entre o facilitador e aquele que aprende (LYON apud Carl Rogers 1977, p. 97).
Lyon enfatiza, no pensamento acima que o educador não é um guia, um modelo a ser seguido. Poder aprender não está nas mãos dele (a) enquanto aluno. Seu papel, como professor é de apenas ser um facilitador de um processo que visa as mudanças das situações, mas isto depende muito mais do aluno. Assim, facilitar a aprendizagem é estar presente não só fisicamente, mas acompanhar a maturação do aluno, de forma congruente, o professor reflete através de seu comportamento enquanto pessoa, a formação cidadã que o aluno precisa para o seu auto desenvolvimento.
A aprendizagem ultrapassa a esfera intelectual. Ela deve tocar o ser para que se torne significativa, e à partir de então, direcionar o que mais importa, ou seja a busca de sentido de vida. Através dela, o sentimento da aprendizagem será plantada, cuidada e florescida.
Aprender, na linha rogeriana, é mudar, é reduzir o grau de dependência com relação ao professor, renunciando a certas satisfações que essa dependência proporciona: é conquistar maior autonomia e, por isso mesmo, é expor-se a novos riscos (JUSTO, 1975, p. 126).
O aluno deve desenvolver constantemente a prática de pensar, repensar e encontrar sua forma, seu jeito de aprender o conteúdo e tornar realmente o conteúdo como uma experiência de vida, racionalizando o conhecimento, favorecendo seu crescimento espontâneo, e desta maneira facilitando o seu processo de aprendizagem.
A aprendizagem significativa verifica-se quando o estudante percebe que a matéria a estudar se relaciona com os seus próprios objetivos. De maneira um tanto mais formal, dir-se-á que uma pessoa só aprende significativamente aquelas coisas que percebe implicarem na manutenção ou na elevação de si mesma (ROGERS, 1972, p. 154).
Quando o aluno se envolve pelo conteúdo transmitido, mesmo que não faça sentido para ele (a), mas por meio de um ressignificar da disciplina proposta, consegue extrair algo de positivo para sua vida, além de simplesmente passar pela matéria, acaba encontrando subsídios necessários para canalizar o conteúdo associando com seu projeto de vida. Fazendo isto, com certeza algo de transformador acontecerá no aluno, no professor e no ambiente na qual está sendo vivenciado a experiência.
Entendo por aprendizagem significativa aquela aprendizagem capaz de influenciar o nosso comportamento, é ameaçadora em certa medida. Se estou prestes a aprender alguma coisa suscetível de mudar a imagem que tenho de mim mesmo ou a forma como reajo a situações, isso não pode deixar de ser perturbador. Toda aprendizagem significativa tende a envolver uma certa dose de ameaça e dor, desde as muito moderadas às, por vezes, intoleravelmente severas (FRICK, 1975, p. 118).
Não é fácil o desprendimento do aluno em aprender, e isto gera um sofrimento psíquico, intelectivo, pois se parte de um esforço e do que já está acostumado a vivenciar na forma do estudo, e enxergar os problemas e dificuldades.
Agindo desta maneira, o processo de aprendizado, se torna sacrificante e ameaçador, e assim sair de uma posição confortável, muitas vezes robotizada no modo de aprendizagem, para uma busca diferente e nova, acaba envolvendo um conflito até existencial, levando o aluno a duvidar de sua própria capacidade.
Por isso que mexer em algum ponto na forma de aprender, pode causar um desconforto e desequilíbrio para o aprendente, pois aprendeu em toda sua vida de um jeito e de repente, aparece uma nova assertiva afirmando: existem novas possibilidades de desenvolver o processo de aprendizagem.
Neste momento, o aluno sentindo-se inseguro, com medo e receoso do que poderá vir, acaba se sentindo travado, por vezes se auto sabotando ou chega ao ponto de não enxergar a ameaça e torna em sofrimento o processo de aprendizagem. É preciso entender este como algo necessário e positivo não só pelo desenvolvimento cognitivo, mas a segurança e a confiança na pessoa, pois esta sim, dará forças para o enfrentamento de suas necessidades.
O potencial do aluno e esta confiança em sua capacidade devem ser exploradas, valorizadas e preservadas, porque este não é apenas o bem supremo da pessoa num processo de realização do estudante, mas sim algo que vai muito além disso, uma marca identitária.
(…) Quando se acha num ambiente em que está certo de sua segurança pessoal e quando se convence de que não há ameaça ao seu eu, vê-se, uma vez mais, livre para (…) progredir no processo de aprendizagem. É por meio de atos que se adquire aprendizagem mais significativa. A aprendizagem é facilitada quando o aluno participa responsavelmente, do seu processo. A aprendizagem auto-iniciada que envolve toda a pessoa do aprendiz – seus sentimentos tanto quanto sua inteligência – é a mais durável e impregnante. A independência, a criatividade e autoconfiança são facilitada, quando a autocrítica e auto-apreciação são básicas e a avaliação feita por outros tem importância secundária. A aprendizagem mais socialmente útil, no mundo moderno, é a do próprio processo de aprendizagem, uma contínua aberta à experiência e à incorporação, dentro de si mesmo, do processo de mudança (LYON, 1977, p. 123-124).
Como é possível inferir do comentário acima, o sujeito se sente ameaçado quando o ambiente não é seguro ou existe nas entrelinhas um ar de arrogância, prepotência no saber, partindo, muitas vezes, dos próprios alunos esta postura. Por isso, a importância do facilitador da aprendizagem entrar em cena e incorporar seu papel neste momento, invertendo a realidade e fazendo do ambiente antes hostil, num local adequado para o aprendizado. Daí a necessidade de o professor, estar consciente e sensivelmente aberto para essas demandas, afim de criar um clima favorável entre os alunos, independente do nível de aprendizagem com que cada um traz em sua experiência.
Numa sala de aula onde as diferenças são bem perceptíves, existem diversas influências que acabam sendo decisivas em práticas que inibem o desenvolvimento do aluno. É possível ver, por exemplo, alunos que sequer conseguem ler em voz alta, por vergonha por exemplo. Também temos casos em que falar em público causa pânico, e outros ainda têm vergonha de ouvirem em voz alta o seu próprio nome.
Os alunos trazem para o ambiente de sala tantas cargas pesadas em sua história, inclusive algumas mal resolvidas, com diversos complexos, traumas, injúrias recebidas ao longo de sua vida e cada um com seus desabores, desgostos, e isto faz com que nós, enquanto papel de educadores, repensemos algumas questões que vão além da burocracia de transmitir o conteúdo e poder concluí-los a tempo por uma obediência institucional, pois existe um compromisso sim, e este por sinal deve ser respeitado, mas não colocá-lo como prioridade absoluta entre os objetivos principais.
Quando um aluno está com uma dificuldade na aprendizagem e o professor, no papel de facilitador, envolve os demais alunos, fazendo com que os mesmos participem desta trama, encorajando este aluno em “apuros”, o grupo todo se beneficia com o processo. Assim, o grupo adquire confiança e segurança de expressarem quem realmente são sem reservas, pois como refere Klockner
Os conteúdos dessas aprendizagens têm também significações sociais. O indivíduo enquanto ser bio-psico-social, vive num mundo onde a interação humana forma o contexto essencial para aprendizagem. No entanto, a educação trata os conteúdos dessas aprendizagens como fragmentos isolados da experiência humana que está sempre numa tremenda mutação/transformação. A facilitação da aprendizagem começa a ser construída quando os atores podem desconstruir seus papéis e a sua relação de poder e se relacionar enquanto co-aprendizes, na clarificação de motivações e estabelecimento de uma comunicação mais autêntica em busca do conhecimento (KLOCKNER, 2010, p. 109).
O contexto relacional é fundamental, a sociabilização entre os alunos faz com que as diferenças diminuam e aumente o fervor e a capacidade de doação pelo próximo ou o aluno que está com maior dificuldade em alguma área na aprendizagem.
Com base nisto é possível inferir que as relações entre os alunos que são estabelecidas no sentido de fazer a aprendizagem desabrochar, depositando confiança a pessoa de cada aluno, e que por diversos motivos possa se sentir retraído perante uma sala inteira, é um dos desafios para que haja aprendizagem significativa.
As dificuldades, por parte do sujeito aluno, são sanadas, se deixarmos o poder de lado, a vaidade, desconstruindo uma imagem de professor ou aluno ideal, partindo da posição de um aprendiz, que sedento pelo conhecimento, mostra os sinais de quem não está só preocupado com seu próprio ‘eu’, individualista, mas concebe a aprendizagem significativa também com a realização do outro, pois como ensina Hannoun
O único homem que hoje podemos considerar como educado, é aquele que tiver aprendido a aprender, que tiver aprendido a adaptar-se e a mudar, que se dá conta de que nenhum saber é seguro, que somente o processo da pesquisa do saber pode dar-lhe base de segurança […] (HANNOUN apud ROGERS, 1980, p. 23-24).
Esta segurança se adquire aos poucos, é gradativa e caminha rumo a uma aproximação daquilo que tenha ressonância com sua vida prática e subjetiva, na qual será utilizado e canalizado de forma que seja viabilizado a aprendizagem como um todo processual, atualizando este aluno que chega muitas vezes desmotivado, receoso, desesperançado nas salas de aula.
Com esta forma de viabilização da aprendizagem, o aluno irá perceber um profundo desenvolvimento no seu modo de aprender, de reter conteúdos, de melhorar seu desempenho ao interpretar uma questão. A partir daí, começa a identificar seus erros e acertos, o que precisa melhorar, aperfeiçoar e encontrar seu próprio jeito de aprender e organizar seu método de estudo em conjunto com os assuntos pertencentes em sala de aula.
A aprendizagem, portanto, não tem término. Ela está sempre em início de seu ciclo e, através disso, se aprimora, ganha cortornos. Isto permite um toque diferente que traz luminosidade ao saber e faz instigar o acesso ao conhecimento, da parte do estudante, em seu papel como aprendiz. Se ele tiver em mente que está por se fazer e refazer, constituir e reconstituir, sempre haverá em cada experiência uma nova produção, e com certeza este aluno encontrará significados profundos em seu caminho de aprendizagem.
REFERÊNCIAS
FRICK, Willard B. Psicologia Humanista. 1ª Ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.
HANNOUN, Hubert. A atitude não-directiva de Carl Rogers. 1ª Ed. Lisboa: Ed. Livros Horizonte, 1980.
JUSTO, Henrique. Carl Rogers: Teoria da Personalidade Aprendizagem Centrada no Aluno. 2ª Ed. Porto Alegre, RS: Emma, 1975.
KLOCKNER, Francisca Carneiro de Sousa. (Org). Abordagem Centrada na Pessoa: A Psicologia Humanista em Diferentes Contextos. Londrina-PR: Ed. Unifil, 2010.
LYON, Harold Clifford. Aprender a Sentir-Sentir para Aprender. 1ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1977.
ROGERS, Carl R. Liberdade para Aprender. 2ª Ed. Minas Gerais: Interlivros, 1972.