EDUCAÇÃO HUMANÍSTICA

A educação, popularmente conhecida no meio social como a base, o sustento, a estrutura para o desenvolvimento humano, traz em si, esta marca, de tornar uma sociedade mais civilizada e com pensamento crítico, com relação a sua condição de pessoa na vida. Convicta de seu compromisso ético, político e moral, se faz necessário investir em cidadania e transformar os homens em seres capazes de se conscientizarem e incorporarem criticamente o seu papel de agente transformador da sociedade.

A Educação Humanista propõe esta formação de cidadania, na qual o indivíduo é o foco em questão, no sentido de sua valorização humana. Várias concepções sobre a educação, trazem este registro fundamental que é, educar o cidadão para formar pessoas que tenham uma postura consciente e crítica de si mesma, sendo capazes de escolher, tomar decisões e serem responsáveis por suas vidas.

Esta consciência crítica se adquire à medida que a educação toca primeiramente o nosso ser, no sentido de sermos verdadeiramente afetados pela linguagem proposta, para em seguida, pensar numa formação de educar para coletividade e assim, levar o ser humano a perceber realisticamente onde está, por quê, para quê, onde pretende-se chegar com sua vida.

Na ótica da educação humanista o que se pretende, passa primeiramente pela educação de si mesmo enquanto pessoa, para depois pensar em afetar a coletividade no sentido de sua formação personalista. Esta forma de encarar a formação educacional, influencia os alunos a se conscientizarem de seu papel identitário como pessoa no que tange a educação superior.

A educação humanística se preocupa com a formação humana do aluno em primeira instância. Com isto, visa a formação de cidadãos conscientes de si, no que se refere ao seu projeto pessoal enquanto um sujeito que busca sentido de vida e o seu papel enquanto educando.

Esta ênfase no humano existente em cada pessoa, leva a educação humanista propor um envolvimento afetivo rumando sua liberdade e autonomia nos processos de criação de sua identidade, onde o componente afetivo é primordial para que esta relação de descoberta de si mesmo possa crescer.

A Educação Humanista, a integração da aprendizagem cognitiva com a aprendizagem afetiva, é um fruto natural da Psicologia Humanista ou Terceira Força (LYON, 1977, p. 29).

Esta Terceira Força considerada na Psicologia, se estende no ramo educacional, na perspectiva de humanização do homem, enfocando o ser humano integral e sua formação personalista antes da construção intelectual. Esta forma de educar de maneira específica, dispõe em três principais ênfases: cognitiva, afetiva e vivencial.

Para a abordagem humanista é a relação interpessoal o centro do processo. Esta abordagem leva a uma perspectiva eminentemente subjetiva, individualista e afetiva do processo de ensino-aprendizagem. Para esta perspectiva, mais do que um problema de técnica, a didática deve se centrar no processo de aquisição de atitudes tais como: calor, empatia, consideração positiva incondicional. Certamente o componenete afetivo está presente no processo de ensino-aprendizagem. Ele perpassa e impregna toda sua dinâmica e não pode ser ignorado (CANDAU, 2008, p. 14-15).

O processo de amadurecimento da pessoa requer em qualquer relação, o componente afetivo. Este se manifesta de diversas maneiras, através do toque físico, o olhar, algum gesto que transmita calor e dê vida as emoções presentes no momento da relação interpessoal. Assim, amadurecer é estar comprometido com a situação da pessoa e o mesmo sentir esta experiência de ser afetado de maneira acolhedora, sem pré julgamentos em relação a sua história.

Até mesmo no silêncio de nossa existência, quando não temos a possibilidade de dizer algo, estamos comunicando, e para o humanista, ele (a) sempre tem um alvo, uma direção comportamental a ser percorrida, que é buscar o humano existente em cada ser.

A abordagem humanista, prioriza as relações interpessoais, onde é o processo que existe entre o eu e o tu que se constroi humanidade, não apenas a soma destes para se constituir uma só pessoa, mas o que é extraído fenomenologicamente entre a experiência da relação eu, tu.

A Educação Humanista proporciona um encontro consigo mesmo, ao encontro de existência inacabada pois está sempre por se fazer, constituir, acontecer. Nossa existência clama por sentido de vida, uma orientação eminentemente subjetiva e introspectiva no indivíduo em seu ser interior.

O homem é considerado como uma pessoa situada no mundo. É único, quer em sua vida interior, quer em suas percepções e avaliações do mundo. A pessoa é considerada em processo contínuo de descoberta de seu próprio ser, ligando-se a outras pessoas e grupos. Quanto à epistemologia subjacente a essa posição, a experiência pessoal e subjetiva é o fundamento sobre o qual o conhecimento abstrato é construído. Não existem, portanto, modelos prontos nem regras a seguir, mas um processo de vir-a-ser. O objetivo último do ser humano é a auto-realização ou o uso pleno de suas potencialidades e capacidades (MIZUKAMI, 1986, p. 38).

Um dos objetivos da Educação Humanista, é propiciar a pessoa que busca o conhecimento, a mudança de sua postura atitudinal, em ligação ao que ocorre no interior organísmico do indivíduo no sentido de haver congruência. A alteração no comportamento, visa o crescimento não só intelectual, mas o enriquecimento dos valores internos, eis uma experiência muito particular, na qual somente a própria pessoa irá descobrir o que realmente deve ser e/ou fazer de sua vida.

A outra na qual nos relacionamos, será importante no processo de reconhecimento. O mesmo servirá de reflexo para si, mas não será um guia para as nossas decisões pessoais, profissionais, acadêmicas ou qualquer que seja. Isto acaba nos retirando a possibilidade de sermos autônomos em nossas ideias e perspectivas, pois o outro, será um auxílio sim, mas nunca o centro de nossa experiência.

Em nosso cotidiano, estamos acostumados que alguém diga o que devemos ou não fazer, qual o melhor caminho para prosseguir na vida, ou seja, o outro sempre está escolhendo e decidindo nossa vida ou querendo que o mesmo aconteça. Desta maneira, fica mais fácil, porque tira um pouco o peso do que falamos e faz quem decidamos pela outra pessoa. Em contrapartida, esta postura, retira a possibilidade de nossa autoria e do protagonismo de nossa história, na qual eu deva ser o centro. Compete a mim, não o outro invadir este espaço de autonomia.

A ausência de autonomia provoca na pessoa, a sensação de que sempre necessita esperar o que deve ser feito, produzido, sem tomar partido das situações como deveria. Nossa tendência pessoal, nessas circunstâncias, é de escorar em algo que nos proporcione segurança, pois assim nos faz sentir que estamos no controle do caso, ou seja, caso se tenha um modelo pronto a ser seguido ou copiado melhor, o que favorece a reprodução de comportamento e o sentimento de desconforto ao longo do tempo por não produzir por sua própria vida.

Para Rogers a realidade é um fenômeno subjetivo, pois o ser humano reconstroi em si o mundo exterior, partindo de sua percepção, recebendo os estímulos, as experiências, atribuindo-lhes significado. Em cada indivíduo, há uma consciência autônoma e interna que lhe permite significar e optar, e a educação deverá criar condições para que essa consciência se preserve e cresça. O mundo é algo produzido pelo homem diante de si mesmo. O homem é o seu configurador, que faz com que ele se historicize: é o mundo, o projeto humano em relação a outros homens e às coisas que ganha historicidade numa temporalidade. O mundo teria o papel fundamental de criar condições de expressão para a pessoa, cuja tarefa vital consiste no pleno desenvolvimento de seu potencial inerente. A visão de mundo e da realidade é desenvolvida impregnada de conotações particulares na medida em que o homem experencia o mundo e os elementos experenciados vão adquirindo significados para o indivíduo (MIZUKAMI, 1986, p. 41-42).

A ótica humanista traz uma visão de mundo, onde o caráter fenomenológico marca sua perspectiva, no que tange a experiência dos atos concretos, por parte do indivíduo, que são emergidos pelo fenômeno, ou seja, o que se apresenta, surge, se manifesta a pessoa. A educação nesta ótica, terá o papel de criar condições e mecanismos que favoreçam a apreensão de significados destes fenômenos, para que se tenha o norte necessário, em vivenciar e encontrar sentido de vida.

Esta experiência de decidir a vida por si mesmo, faz com que o indivíduo, conscientize de sua autonomia, sem que interferências externas o influenciem nas diversas escolhas que precisará ser tomada.

À medida que o homem está no papel de aluno (a) e ali descobre suas realidades essenciais e consegue atribuir significado na experiência de sentir as situações vivenciadas, este (a) desabrocha humanamente, pois a visão de mundo e de pessoa se refletem na compreensão daquilo que foi adquirido, percebido, capturado pelo sujeito, os significados mais profundos desta experiência são aceitos, reconhecidos e valorados pelo autor de sua própria vida, a pessoa que se experencia na situação:

Ao experenciar, o homem conhece. A experiência constitui, pois, um conjunto de realidades vividas pelo homem, realidades essas que possuem significados reais e concretos para ele e que funciona, ao mesmo tempo, como ponto de partida para mudança e crescimento, já que nada é acabado e o conhecimento possui uma característica dinâmica. A educação assume significado amplo. Trata-se da educação do homem e não apenas da pessoa em situação escolar, numa instituição de ensino. Trata-se da educação centrada na pessoa, já que essa abordagem é caracterizada pelo primado sujeito. No ensino, será o “ensino centrado no aluno” (MIZUKAMI, 1986, p. 43-44).

A missão da educação humanista tem como premissa, educar o homem, para que este possa extrair significado à partir de sua experiência de vida. Esta privilegia a formação do caráter original da pessoa, que por sinal influencia na apreensão dos significados essenciais para sua vida, irá aprender como aprender, ou seja, saberá se adaptar a novas realidades que porventura possam lhe aparecer.

É no mundo vivido que o aluno experencia possibilidades, condições para escolhas, tem a capacidade de ter poder decisório e se responsabilizar pelo próprios atos. Apreende os significados, pois na história de cada pessoa, são marcadas os pontos relevantes em cada vivência, que forma a consciência crítica do sujeito.

O entendimento de educação como humanização do indivíduo, reporta-se a uma educação estética, que tem como referência a construção dos sentidos humanos. Estimular, sentir e envolver uma rede de percepções presentes em diversas práticas e conhecimentos humanos. Portanto, o desenvolvimento da sensibilidade leva aprender a ver, a sentir, a ouvir, a pensar, e a refletir o mundo a partir da alfabetização estética (MARQUES, 2009, p. 50).

A estética é um exercício profundo de olhar para si reflexivamente e dela, fazer emergir toda a criatividade existente, em favor da produção de sentidos. Sendo assim, sua função é valorizar e escutar a realidade sensível do ser pessoa, na qual o aluno terá convicção de seu atual momento, sabendo onde está no sentido de localização de tempo e espaço, por que está e em que lugar se quer chegar para exercer o ofício de ser pessoa, antes de qualquer classificação que possa caracterizá-lo como papel de aluno.

A educação do homem, em se tratando especificamente numa formação humanista, a priori, é algo que visa formar o cidadão, além das possibilidades acadêmicas. Quando se pensa assim de forma integrativa, em uma questão que envolve professores, alunos, instituição, o sistema educacional como um todo, desta maneira atinge construtivamente a personalidade humana, e isto faz amadurecer a pessoa que experencia os fatos de sua vida.

A educação humanista é retrato de uma filosofia do homem. Através dela é que o ser humano se permitirá o processo de humanização e é por meio deste que a educação estética se torna presente. Também é pelo desdobramento de ser humano que a estilística de ser pessoa acontece, na qualidade de buscar a essência de vida que lhe é devida para cada um.

Concernente a isto, deparamos com a seguinte constatação: este tipo de educação está em falta, ou seja, a capacidade de sentir, de expressar ou simplesmente tocar os afetos, cada vez mais acabam gerando o aprisionamento das emoções e isto está tomando conta da humanidade. Este aprisionar é um não saber lidar com os próprios sentimentos, numa realidade na qual mal as pessoas conseguem identificar suas emoções, quem dirá saber como vivenciar na prática o que sentem e como podem manifestar estes que servirão de base para o amadurecimento afetivo.

Somente por meio da reflexão a partir da sensibilidade, é possível entender as diferenças entre um ser humano e outro, entre um ser humano e o mundo. Não se pode mais negar a realidade sensível e sua multiplicidade de significações, nem mesmo, o poder da imagem e da percepção estética como fontes de conhecimento, muito menos a natureza humana. É preciso resgatar no cenário educacional o conhecer para melhor sentir e sentir-se para melhor saber e nessa clareza resgatar o que ficou perdido: A sensibilidade! Valorizar o prazer e a indagação sobre a razão de ser de cada ato (MARQUES, 2009, p. 53-54).

A busca incessante por sua questão identitária, requer a arte de se conhecer, se reinventar, estar aberto a novas possibilidades de conhecimento e crescimento pessoal, sabendo que todos carregam em si, a arte de ser humano. E esta condição que ninguém está isento de viver.

A educação humanista no sentido de ser uma abordagem que privilegia o humano, valoriza, ao mesmo tempo, resgatar a sensibilidade humana, com objetivo de fazer o homem se tornar uma fonte de reconhecimento personalista à partir dos sentimentos humanos. Conhecer o processo de aprendizagem do sujeito, não se dá somente por via cognitiva, intelectiva. É preciso saber sentir para aprender e apreendendo, sentir o aprendizado, sendo afetado pelos sentidos para provocar mudanças no ser, favorecendo assim a criação de consciências pensantes.

O homem não é apenas razão, é também afetividade. Por isso, nenhuma formação puramente intelectual dará conta da totalidade do humano. Daí a importância da arte como instrumento não só de produção e fruição estética – o que se destaca ao se pensar nos dois pólos de formação do artista e do apreciador de arte -, mas de humanização propriamente dita, ou seja, a educação estética é instrumento de valorização integral do homem, isto é, de todo homem e de qualquer homem. A palavra estética, na sua origem etimológica (do grego aisthesis), nos remete aos significados “faculdade de sentir”, “compreensão pelos sentidos”, “percepção totalizante”. Assim, diferente da ciência e do senso comum que apreendem o objeto pela razão, a arte é uma forma de conhecimento que organiza o mundo por meio do sentimento, da intuição e da imaginação. É exatamente o que nos interessa aqui. Explorar os sentidos, cultivar os sentimentos, abrir-se para a imaginação, aceitar o desafio da intuição é educar-se para a criatividade, para a invenção, para o novo (ARANHA, 1996, p. 121).

Para que o ensino não se torne algo ‘robotizado’, mecânico, é necessário desenvolver um trabalho que favoreça uma formação propiciadora de um encontro vivencial com os alunos, contribuindo para que os mesmos pensem e racionalizem acerca de suas vidas, além do que é proposto no ambiente acadêmico, especificamente numa sala de aula.

Sendo assim, o aluno começa a subjetivar sua própria vida e através das ideias e do pensar crítico, cria condições para que possa transformar o desenvolvimento de um ensino/aprendizagem em algo concreto, ultrapassando os limites institucionais impostos, sem desrespeitá-los.

 

REFERÊNCIAS

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofia da Educação. 2ª edição. São Paulo: editora Moderna, 1996.

CANDAU, Vera Maria. (Org). A didática em Questão. 28º ed. Petrópolis-RJ: Vozes, 2008.

LYON, Harold Clifford. Aprender a Sentir-Sentir para Aprender. 1ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 1977.

MARQUES, Sônia Maria dos Santos. Et al. Conhecimentos, (Re) Construções e Práticas Pedagógicas. Francisco Beltrão: Unioeste – Campus Francisco Beltrão, 2009.

MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: As Abordagens do Processo. 1ª edição. São Paulo: editora EPU, 1986.