Em Rogers esta tendência é pertencente à natureza humana necessitando ser descoberta, explorada vivencialmente, como uma flor que é plantada, regada, necessita do calor e de condições favoráveis para o seu crescimento, para tanto, precisa ser cuidada, protegida, acolhida e aceita em sua experiência de florescer. Respeitar o ritmo e os passos a serem seguidos é de extrema importância, para que o tempo de colheita seja de maneira espontânea e no momento adequado:
O organismo possui uma tendência básica, um apelo fundamental: atualizar-se, manter-se, desenvolver-se. Todo organismo é animado de uma tendência inerente a desenvolver todas as suas potencialidades e a desenvolvê-las de modo a favorecer-lhe a conservação e o enriquecimento. “Organismo” designa a totalidade do indivíduo: o conjunto psico-físico-social. O termo “enriquecimento” abrange tudo o que a pessoa considera valioso para ela: tanto o que possui como o que é – bens materiais, habilidades, talentos, qualidades, satisfações … A orientação adequada não pode efetuar-se, evidentemente, sem a capacidade de perceber a situação real do organismo (JUSTO, 1975, p. 17-18).
Reconhecer esta tendência é partir da própria subjetividade, aceitar o clamor interno, é poder manifestar o que o organismo está pedindo no momento, como: atualização, manutenção e desenvolvimento. Quando atualizamos algo, queremos que volte a ser o mesmo ou ainda melhor do que a realidade anterior, portanto, a partir de agora a experiência secundária nunca será a mesma, por mais parecidas que sejam, são outros olhares, momentos diferentes, reações organísmicas diferentes.
Manter a experiência ativa, é reconhecer que modificamos a todo instante a partir do sentir a vida e das relações. É, por assim dizer, um estado de vigília para com o organismo, que sempre deve ser olhado, visitado e experienciado de outros modos.
O desenvolvimento da tendência à atualização, é vivenciar o que lhe faz enriquecer o organismo, numa totalidade envolvendo o ser integral bio-psico-social e espiritual, este último como ênfase maior a abertura à experiência. O enriquecimento não é apenas o organismo ser saciado pelas vontades, desejos, necessidades ou sonhos, mas é viver o que leva a auto-realização:
Self, estrutura do self, são termos que servem para designar a configuração experiencial de percepções: referindo-se ao indivíduo, às suas relações com o outro, com o ambiente e a vida em geral, assim como aos valores por ele atribuídos a essas percepções. O self resulta, portanto, da diferenciação da experiência organísmica total do indivíduo, sendo um dos aspectos centrais do crescimento da pessoa (JUSTO, 1975, p. 21).
Incorporar um self ideal não exige um comprometimento com aquilo que precisa ser feito. O refúgio é a idealização das imaginações acerca da estrutura de um eu fortalecido, seguro e confiante, mas um caminho angustiante ao mesmo tempo, porque o que gostaria, o que quereria, por vezes se coloca acima da realidade da pessoa, não existindo pois a congruência.
A percepção realista de si gera um desprender-se de vaidades que talvez sirva para o campo da ostentação, de vantagens recebidas por viver um determinado tipo de comportamento, alimentando o ego e fazendo acreditar que o modelo vivido verdadeiramente, é o real. Porém, no silêncio da intimidade, percebe-se inseguro, frágil, ameaçado e sem coragem de assumir sua identidade.
Vive-se a imagem ideal que faz de si, mas se sente ameaçado a cada situação ou movimento que o faz recordar quem realmente é, uma ambiguidade de sentimentos, ao mesmo tempo uma defesa ao ser reconhecido pela verdadeira realidade vivida.
Para Rogers, ao contrário, o meu ser verdadeiro é aquele que me aparece quando <<me deixo ir>>, quando me deixo levar pelas minhas tendências profundamente enraizadas na minha afetividade (HANNOUN, 1980, p. 122).
Esta direção se confunde muitas vezes pelo calor de um momento, algo que aparenta ser arrebatador, mas que é passageiro, pois as incongruências levam a decisões rápidas, superficiais, respostas imediatas e consequências quem sabe desastrosas.
Mas há em nosso campo fenomenal, os atrativos e estímulos que são captados pela consciência, atingindo profundamente nossas raízes, fazendo-nos sair do lugar que estamos e transportando para outros mais intensos, onde se encontram os significados mais desejosos da alma.
Quando sinto que uma atividade é boa e que vale a pena prossegui-la, devo prossegui-la. Em outras palavras, aprendi que a minha apreciação “organísmica” total de uma situação é mais digna de confiança do que o meu intelecto (ROGERS, 2009, p. 26).
É necessário dar créditos a razão, mas não ficar refém dela. O intelecto é uma via que nos orienta, nos faz pensar e problematizar a vida, o outro e as diversas situações. Por outro lado, a experiência do organismo não se dá só através do intelecto, mas um conjunto de órgãos que estão se relacionando e acontecendo simultaneamente.
Dar apreço e confiança total ao organismo é viver a tendência direcional em que o organismo está indicando para o mesmo, com isto, a pessoa sentindo esse movimento integrado, tende a se auto realizar na dimensão congruente da experiência, esta que será pontuada no próximo capítulo.
REFERÊNCIAS
HANNOUN, Hubert. A atitude não-directiva de Carl Rogers. 1ª Ed. Lisboa: Ed. Livros Horizonte, 1980.
JUSTO, Henrique. Carl Rogers: Teoria da Personalidade Aprendizagem Centrada no Aluno. 2ª Ed. Porto Alegre, RS: Emma, 1975.
ROGERS, Carl R. Tornar-se Pessoa. 6ª Ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009.